Especial - Raul Seixas, um sacerdócio incomum.
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imagem extraída da internet |
(em memória de Godô, Vinícius e Ivan)
“Porque está escrito: Destruirei a sabedoria dos sábios, e aniquilarei a inteligência dos inteligentes. (...) Mas Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias; e Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes; E Deus escolheu as coisas vis deste mundo, e as desprezíveis, e as que não são, para aniquilar as que são”. (I Coríntios 1. 19 e 27,28)
Poucas são as pessoas que se interessam pelo passado. Como exemplo disso podemos citar os bibliotecários, paleontólogos e historiadores. Certa vez, Roberto Civita (1936-2013) disse que não era fácil a missão de transformar o importante em interessante. A igreja parece sempre ser esse instrumento que olha para o passado, e como poucas pessoas gostam do passado, poucas pessoas percebem a importância da sua missão. A igreja assim como os veículos de comunicação tem a missão de transformar o importante em interessante. A sua missão é cheia de urgência, mas sem uma linguagem contextualizada essa urgência se torna incapaz de atingir o seu público.
Na segunda metade do século 20 a igreja brasileira se encontrava no coração desse grande dilema. Uma liturgia que celebrava um passado sem necessidades, palavras em latim que não conseguiam traduzir o anseio do homem comum do campo e da cidade. Rituais e simbolismos difíceis demais para serem celebrados e abraçados por quem está dedicado em viver a extraordinária vida comum do lar e do trabalho. Por conta disso, por vezes Deus teve que se valer das coisas loucas deste mundo, dos sentimentos malucos dessa vida, da metamorfose de emoções para confundir a força dos poderosos e a inteligência dos sábios (I Coríntios 1).
SE NÃO TEM TU, VAI TU
MESMO!
“Porque o Senhor se levantará como no monte Perazim, e se irará, como no vale de Gibeão, para fazer a sua obra, a sua estranha obra, e para executar o seu ato, o seu estranho ato. (Isaías 28:21)
Uma igreja que não conseguia despertar em massas, interesse nas coisas virtuosas, na espiritualidade que aponta para a eternidade. Ficou claro para Deus que se ele não fizesse alguma coisa nada iria mudar, então se valendo das coisas loucas desse mundo, Deus encontra a maior loucura, não uma loucura feia, não uma loucura qualquer, Deus encontra uma Beleza Maluca. É inegável que a obra de Raul Seixas foi usada por Deus indiretamente para despertar uma geração que não tinha interesse algum por coisas espirituais, seus símbolos e seus significados. Cantando coisas do coração, da vida, da água e do ar, Raul Seixas abri um caminho importante para uma espiritualidade que nas décadas seguintes encontraria abrigo seguro no coração da sociedade brasileira.
É impossível diante da obra, negar o sacerdócio de
Raul Seixas. Raul foi um homem espiritual por toda a sua vida e carreira, um
ramo que nunca esteve ligado a Videira Verdadeira. Ele não sabia, mas o seu
sonho de uma sociedade alternativa era incitado pelo sonho de Deus, de
construir entre os homens uma sociedade de virtude e misericórdia (Ef 2. 19). Raul foi um Sansão que nunca soube bem por que amava
mulheres “filistéias” (Jz 14. 4).
Quase fim dos anos 80. Pátio da E. M. Dalva de Oliveira, Jardim Novo - Realengo.
"Toca Raul!"
QUANDO A FICHA CAIU, JÁ ERA TARDE!
Seu sacerdócio era rico de poesia e espiritualidade, mas sem Cristo todo é qualquer amor por mais que raso, largo e profundo é um quase nada (Cl 1. 26). Visando um bem maior que estaria ainda por vir, Deus usou Raul Seixas para “ser os olhos do cego” (I Co 2. 7). Raul seria a mosca dessa litúrgica sopa fria que ninguém queria tomar, mas saborosa (Ef 3. 9). Foi por causa dele que a dona de casa colocou o prato sobre o fogão quente. Por um tempo se cantou aqui em terras tupiniquins que o diabo era o pai do rock, paternidade essa que ele nunca assumiu, mas veio para ver se a criança era bonita. Pois como a gente bem sabe filho feio não tem pai. Quando o diabo chegou aqui em terras fluminenses já era tarde demais.
Os mexicanos costumam dizer que o diabo sabe mais por ser velho do que por ser diabo. Não demorou e ele percebeu que o Deus Poderoso estava no processo de abrir os olhos aos cegos. E que caberia a ele – diabo – transformar Raul Seixas na “cegueira da visão”. Ele perdeu o “trem das sete”, Raul já tinha comprado um sítio no sertão de Piritiba e lá havia mais, muito mais que dois pés de guataiba, caju, manga e cajá. Para além do abacate, jenipapo, bananeira, milho verde e macaxeira, o diabo encontrou uma sociedade roçada, arada e semeada com palavras que iriam colocar as gerações seguintes aos pés do Evangelho e da verdadeira espiritualidade que salva a alma dos homens. Quando chegou lá, confessou estar abestalhado, decepcionado, por que a piada era um tanto quando perigosa: Raul, um sacerdote incomum, de uma igreja invisível, que seria décadas depois liderada por “Por João de Santo Cristo”.
INCONCLUSÃO. RAUL MORREU NÃO TENDO VIVIDO.
O menino que tinha paranoias com Deus foi aprisionado dentro de sua própria genialidade, escravo de sua visão distorcida de amor. Pregou sem saber que o “NOVO AEON” lhe fora dado por Cristo Jesus. Saiu do trono de Ipanema no corcel 73, esperando encontrar o moço do disco voador, lá pelas bandas da avenida Brasil e se perdeu em seus romances astrais. Destruiu paradigmas alheios, mas morreu dentro de uma “Panela do Diabo”, que foi não conseguir se livrar do alcoólatra que lhe sabotava sempre, e esse foi “o dia em que a terra parou”.
Raul fez em uma década o que Padre, Pastor ou Sacerdote algum faria em “10 mil anos”. Ele irrigou com letras de amor e espiritualidade um solo abandonado pelo descaso da religiosidade de homens enclausurados e santos demais. Raul morreu sem nunca ter vivido, mas agora vive sem nunca ter morrido, como uma metamorfose interrompida pela tragédia que veio vestida de cetim.
O menino sonhador que saiu do interior da Bahia, que foi usado por Deus para ajuntar palavras preciosas e desconexas no coração de uma geração. Raul foi o instrumento que Deus usou para reunir uma legião, uma LEGIÃO URBANA.
Mas essa é a história para os 80 anos de Renato Russo!
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