Pneumatologia - Virtudes Vocacionais (II Tm 3. 10).

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O ESPÍRITO SANTO E
AS VIRTUDES VOCACIONAIS.

“Mas você tem seguido de perto o meu ensino, a minha conduta, o meu propósito, a minha fé, a minha paciência, o meu amor, a minha perseverança”.

            “Deitado em sua cela, prisioneiro do SENHOR, Paulo ainda se preocupa com o futuro do Evangelho. Sua mente vagueia pensando ora na maldade dos tempos, ora na timidez de Timóteo. Timóteo é tão fraco e a oposição é tão forte!” Desse modo, Jonh Stott começa o seu comentário sobre o terceiro capítulo dessa carta! (Pág. 75, A Mensagem de 2 Timóteo, Tú Porém. - Editora A.B.U). Os dias de seu martírio se aproximavam, todavia, ele não entregara a fé. Num último esforço de devoção e dever, escreve para seu filho na fé (Fl 2. 22). O Evangelho de Jesus triunfará, e Timóteo é agora a fiel testemunha dessa verdade!

Obrigado Paulo! Obrigado Timóteo!
Já é 2019 e o Evangelho triunfou desde aqueles dias, pelas vilas e lugarejos da Galileia. E eu também me esforçarei para que outros saibam disso, em todo tempo!

A Pneumatologia de Paulo.

O Espírito Santo em sua doutrina é o doador das virtudes vocacionais (Rm 1. 12). Que são virtudes responsáveis por manter saudável o relacionamento do homem com Deus, Seu criador, com seus semelhantes e consigo mesmo (Gn 2. 18). Jesus morreu por relacionamentos e o Espírito se responsabilizou por fazê-los ser verdadeiros e saudáveis. Tão sério e urgente tal coisa era para a igreja primitiva, que um termo para essa urgência foi cunhado e entre nós sobrevive: “koinonia”. Em seu já conhecido e admirado esforço para um perfeito entendimento das Escrituras, Jonh Stott em seu livro “A Igreja Autêntica” vai nos lembrar – e eu aqui sintetizo sua fala – que “koinonia” não é uma palavra somente. É um significado que deve ser inserido em nossos relacionamentos. E em certo ponto ele diz: “No entanto, essas imagens ficam bem longe do que o Novo Testamento chama de koinonia. Precisamos resgatá-las de suas caricaturas e recuperar sua autenticidade neotestamentária”. (Pág. 87 – Capítulo 5 - Editora A.B.U, 2013).

Por pelo menos três vezes Paulo vai falar de um conjunto de virtudes vocacionais. Sua mais famosa fala se encontra – evidentemente – em Gálatas 5. Mais ele ainda vai falar de mais duas listas de virtudes vocacionais, de modo fragmentado, mas não menos importante para a nossa compreensão. Em Colossenses 3 ele vai falar de virtudes vocacionais que potencializam o exercício do perdão (assunto do qual escreverei em outro texto). Em sua fala para Timóteo está o dever pastoral. A disciplina pessoal é um tema caro para qualquer ser humano. Mais caro ainda, quando esse ser humano é chamado por Deus para cuidar de outros seres humanos (I Tm 4. 13).

Por meio do Perdão, o Espírito Santo metaboliza verdades que transformam estranhos em irmãos, que fazem de ajuntamentos de pessoas uma família. Em “Perdão: Encarnação da Graça”, Caio Fábio vai afirmar com vigor que a disciplina deve ser aplicada naqueles que ferem as relações interpessoais, e que as palavras de Jesus em Mateus 18 são nesse sentido (pág. 18, 19 – Editora VINDE, 1995). Nenhum pecado cometido pelos homens deve nos separar dos irmãos e da comunidade. Se isso não for revertido e aceito (I Co 5. 2), toda a verdade da igreja fica refém de um entendimento carnal: “E, se não as escutar, dize-o à igreja; e, se também não escutar a igreja, considera-o como um gentio e publicano”.  (v. 17).

Somos filhos de Deus, nascidos de novo, pela ação do Espírito Santo, que fez de nós cartas vivas dessa Sua verdade. É o Espírito Santo que enxerta em nós tudo o que precisamos para construir família e igreja em todo e qualquer lugar (At 1. 8). Essa ação do Espírito Santo é maravilhosamente descrita por Paulo em Romanos 8 (vs. 26 ao 30). É Ele, que superando a nossa fraqueza, age em todas as coisas e pessoas para dar testemunho do sacrifício e propósito de Jesus. De apresentar a Deus uma família, que são homens e mulheres capazes de caminhar em relacionamentos restaurados (v. 29).

Tal entendimento, por ser sublime demais, transcende a realidade – dita – espiritual. Platão (IV a.c.), em sua famosa obra “República”, dizia que “Sabedoria, Fortaleza, Temperança e Coragem, são as virtudes que uma CIDADE deve possuir” (Ef 2. 19).




A sabedoria dos sábios. Davi e Paulo.

Paulo e Davi sabiam bem que são as pessoas que protagonizam tempos difíceis. Davi por sua experiência com Saul. Paulo por suas experiências com seus antigos pares e com os gentios e bárbaros. Nos primeiros dez anos de caminhada cristã me custou muito caro “romancear” a figura pastoral. Eternizei esse aprendizado numa poesia que escrevi em 2009 por título:

MEMÓRIAS DE MINHA INFÂNCIA EM REALENGO.

Quando era criança acreditava que as montanhas eram monstros gigantes adormecidos. Eu estava olhando para os lugares errados.
Os monstros gigantes estão dentro dos homens e não adormecidos como imaginava. Hoje sei que as montanhas são apenas montanhas.
Que nos homens habitam monstros gigantes e que monstros gigantes não existem. (Ney Gomes – 21/02/09)

Numa outra poesia e em outro lugar, Davi escreve:
“Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte,
não temeria mal algum, porque tu estás comigo;
a tua vara e o teu bordão me consolam”. (Salmo 23. 4)

Não distante dessa verdade, mas com um pouco menos de poesia, Paulo afirma:
“Sabe, porém, isto: que nos últimos dias sobrevirão tempos trabalhosos.
Porque haverá homens...” (II Tm 3. 1, 2)

         O que Davi sabia, que Paulo sabia, que Timóteo ficou sabendo, e que eu aprendi por experiência dorida, é que os homens sempre estão por detrás dos maus momentos que passamos! Davi descreveu isso na palavra “bordão”. Que é um pau, um porrete, uma clave, com a qual o pastor atordoava ou mesmo matava uma fera que vinha contra seu rebanho. Warren W. Wiersbe em seu consagrado comentário dos livros poéticos, ao falar do Salmo 23 afirma: “O "vale da sombra da morte" representa qualquer experiência difí­cil em nossa vida que nos enche de temor, inclusive a morte” (Pág. 134 – Com. Bíb. Expositivo – Poéticos – Editora Geográfica). Nota-se que em sua mão não há uma tocha, lâmpada ou lamparina. O medo não é da escuridão, mas das pessoas que por lá habitam. “Bordão” nos lembra que pessoas causam feridas e problemas reais. E que gente inteligente não ‘anda’ por aí, como que ignorando isso.

            Já Paulo, com menos poesia, afirma a mesma coisa, colocando o homem e sua ‘dureza’ de coração no centro dos problemas que adoecem o mundo. Não são os sistemas (político, militar, econômico e religioso) que matam os homens. São os homens (travestidos de sistema) que matam seus semelhantes. Armados para isso, com seu mais puro egoísmo e natureza decaída. Timóteo precisa ter isso em mente para fazer bem o seu trabalho. E Paulo não pouparia recursos para descrever isso (vs. 2- 9).

            Quando nos afastamos das verdades fundamentais do cristianismo, somos facilmente escravizados por ‘sofismas’. O Professor e Pastor Sérgio Gil em seu livro “Comunhão Contemporânea” fala desses riscos, de deixar outras coisas que não seja o cuidado com a ‘koinonia’ gerenciar nossos encontros e motivações (koinonia na melhor tradução é gente cuidando de gente). A persuasão, a retórica, a relativização, o hedonismo, a avareza, todas essas coisas constituem num problema de homens. Homens que criam problemas para outros homens! (Pág. 43- 50 . Editora Contextualizar, 2013).

            Tantas desgraças, hoje assistidas na igreja, de modo midiático e assombroso vem apenas de um lugar: de um entendimento histórico errado. As pessoas (e não coisas) são importantes por que é nelas que Deus habita. O Pastor Joel Cardoso de Oliveira em seu livro “Princípios” vai nos lembrar que o “culto não é um programa, o culto é a vida”. Ele diz que o “objetivo da convivência entre os irmãos deve ser dar suporte uns aos outros”. Numa IGREJA SAUDÁVEL, os relacionamentos são por onde tudo acontece e a faz crescer. Sob esses relacionamentos e seus cuidados ele afirma: “Quando um irmão é alvo da atenção de outro, ou de um grupo de irmãos, a motivação deve ser o ajuste da vida do irmão, e não, simplesmente, a solução de um problema (...). Os irmãos devem ser tratados em amor e por amor”. (pág. 53, 54 – Editora PróReino, 2015). O que ele afirma é que o amor e a verdade são os guardiões da comunhão. E que outra motivação qualquer é sofisma que nada sustenta.

            O que Paulo e Pedro escreveram sobre virtudes vocacionais está em perfeita sintonia com os ensinos de Jesus. O “Sermão do Monte”, chamado por teólogos diversos de a ‘espinha dorsal do cristianismo’, nada mais é, do que uma atenção especial ao tema (Mt 5. 1- 12). Os Apóstolos ampliaram esses ensinos e ‘categorizaram’ sua atuação e onde elas se faziam necessárias. Paulo, aos Coríntios chega mesmo a sintetizar: “O Reino de Deus é virtude. Em Romanos (14. 17), apontando seu papel ímpar nas relações ele afirma: “Porque o reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, e paz, e alegria no Espírito Santo”. Justiça fala de nossas relações com o próximo, Paz, com Deus e alegria, consigo mesmo! E nada disso existe ‘em condições perfeitas’ diante de Deus sem um novo nascimento (Jo 3. 3/Mt 5. 48/I Co 4. 20).



A Síntese de Seu Aprendizado Pastoral.

Apesar de primeiro ensinar e depois dar testemunho da sua autoridade (por que a autoridade está na vida). É bom lembrarmos aqui de início que Paulo fala daquilo que lhe é próprio e dá certo. Com essas palavras ele afirma para Timóteo: “Perseguições e aflições tais quais me aconteceram em Antioquia, em Icônio, e em Listra; quantas perseguições sofri, e o Senhor de todas me livrou”. (v. 11)

Sobre isso, espero deixar o ‘preciosismo’ de meu entendimento. Perseguições são realidades do mundo que nos alcançam dentro da igreja. E Aflições é quando saímos da realidade da ‘igreja’ para perseguir alguma coisa que está no mundo (sistema). Culturas, tradições, religiões, todas são produtoras de perseguições e aflições diversas. Todavia, entrando (perseguição) ou saindo (aflição) não devemos nunca, ser encontrados nus, isso é, sem virtudes (Mt 5. 11/Jo 16. 33). Paulo dá ênfase as perseguições em sua fala, por que em seu estilo de vida, pouco lhe interessava no mundo (Gl 6. 14). E vai lembrar que o ‘sofrimento’ pela causa do Reino – aos pastoresnão é algo opcional (2. 2). Nesse caso, o sofrimento de Paulo é produto de suas perseguições e não aflição (2. 9). Paulo está disposto a proteger a imagem da igreja, e por isso, recorre a eventos antigos, não ligados a vida da igreja (Antioquia, Icônio, e Listra). Certamente seus sofrimentos junto a igreja eram maiores e mais frequentes, mas não seria de ‘incentivo’ lembrar àquelas alturas, isso a Timóteo.

A coragem é uma característica que se adquire. Paulo sabia que Timóteo encontraria a sua mais cedo ou mais tarde. Mais uma vez ele lembra que é preciso ter junto a si um conjunto de virtudes para o bom desempenho do ministério pastoral. E como num testamento, deixa para seu filho na fé a própria fórmula que encontrou e desenvolveu em Deus. Seu segredo para se ter uma vida e ministério com aproveitamento pleno:

1.       Coisas que se deve ter para os outros: ensino e conduta santa!
Ensino fala sobre ser encontrado capaz de receber e transmitir aos outros os valores que restauram nosso caminhar!

Conduta é o testemunho que eu dou, de que creio nesse ensino! Ensino é dizer que livros são importantes. Conduta é comprá-los. Ensino é dizer que a oração traz resposta. Conduta é frequentar a consagração semanal da igreja. Ensino é dizer que Deus é bom, conduta é ir regularmente nas reuniões públicas.

2.      Coisas que se deve ter para Deus: Propósito e fé!
Propósito é a descoberta do para que eu nasci! O propósito de nossa vida foi totalmente restaurado por Cristo na cruz, bem como a identidade e o destino. “Sei de onde vim, onde estou e para onde vou”!

, sou eu usando toda essa descoberta para a “glória e louvor de Deus”. Em Gálatas 5 essa disposição está em outra ordem, mas por aqui, Paulo escreve a um pastor, que tem obrigações sempre para com os outros! Lá, Paulo fala ao povo e começa por essa obrigação para com Deus.

3.   Coisas que se deve ter para si mesmo: Longanimidade, amor e perseverança!
Longanimidade é a capacidade de se manter fazendo alguma coisa que parece ser difícil ou não ter recompensa. Paciência é uma característica gêmea da esperança. Do grego makroyumia, makro+thumia, que significa “possuir ânimo longo”. Que também significa “grande temperamento”, “magnanimidade”, “grandeza de espírito”, “generosidade”, “longa espera da mente, antes de ceder lugar à ira”.

Amor sou eu sempre agindo da melhor maneira em toda e qualquer situação que envolva pessoas! (Jo 3. 16). Salomão nos lembra disso em Provérbios 5, quando diz em quatro versículos que o AMOR trata daquilo que acaba bem, que encontra um bom fim (vs. 1- 4). Toda e qualquer atitude é diferenciada quando envolve valores humanos (Cl 3. 14). Amor é a virtude que faz pessoas darem certo! Dizia William Shakespeare: “Amor é quando você tem todos os motivos do mundo para desistir de alguém e não desiste”. E em que outro lugar essa qualidade seria bem descrita, senão aqui, no diálogo de Deus com Abraão. Em ocasião da destruição de Sodoma e Gomorra! O combinado mínimo foi 10 e ainda assim, encontrou o SENHOR maneira de salvar 3 de 4 (Gn 18. 32).

Perseverança sou eu permanecendo firme quando as verdades da minha crença são testadas e questionadas! Sou eu agindo com a firmeza dos meus valores para manter firme a trajetória de vida que Deus estabeleceu para mim! Condição que nos possibilita ir até o fim com qualquer projeto que nos foi confiado, ainda que se sofra dano, perda ou prejuízo (Ec 7. 8). Não é difícil reconhecer aqui a “Fortaleza”, considerada na teologia católica uma das 4 virtudes cardeais/cardinais. Gente que persevera é uma fortaleza de outras virtudes. Uma virtude que nos renova, como no amor de mãe. Figura de fortaleza e perseverança bem descrito está em I Co 13, quando Paulo fala sobre o amor que tudo suporta e por isso, tudo renova, tudo restaura!



Ortopraxia Conclusiva.

Heresia é como chamamos a análise que encontra erro na doutrina cristã. E chamamos de hipocrisia a análise que encontra falta de virtudes nos relacionamentos (At 5. 1- 3). As ditas, mentiras relacionais, são sempre as piores mentiras (Claro! Depois de mentir para si mesmo, como bem já acusava Renato Russo em sua famosa canção). O que poderíamos acrescentar (Gn 37. 31- 33) a doentia novela de José com seus irmãos? O que poderia ser derramado de tragédia sobre o caso de Ananias e Safira? Salomão, ainda no uso de suas memórias afetivas escreve das coisas que Deus detesta e abomina e essa última, ele fala do que semeia contenda entre os irmãos (Pv 6. 19). Virtude é todo bem que não acontece por acidente e acaso. Desde quando paus, pedras e ferragens são a causa de problemas na igreja? É Craig Hill que vai nos lembrar que 98% dos relacionamentos acontecem de forma NÃO verbal.

            E onde mais o Espírito Santo colocaria virtudes? Ora, se Jesus morreu por relacionamentos, elas não poderiam e não deveriam estar em outro lugar mesmo!


Ney Gomes é o autor do BLOG Grãos de Entendimento,
um trabalho de 12 anos, com mais de 750 textos publicados.
Também é o autor de “Êxito Sobre os Desertos”,
livro publicado pela editora Reflexão em 2017.

07/01/2019 – Twitter@neygms
"Se trabalhamos e lutamos é porque temos colocado a nossa esperança no Deus vivo." 1 Timóteo 4.10



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